Quais são os resíduos mais comuns encontrados no oceano?
Há ainda relativamente poucos estudos no mundo sobre os diferentes tipos de detritos plásticos encontrados no oceano. No entanto, os cientistas observam a sua omnipresença mesmo longe de qualquer habitação humana, na terra como no mar, desde o topo do Monte Evereste, nas geleiras da Antártica, nas ilhas desertas no meio do Pacífico, até no oceano profundo, como a Fossa das Marianas numa profundidade de mais de 10 km.
No oceano profundo, sacos de plástico e latas de alumínio
O Mbari – Monterey Bay Aquarium Research Institute – é um instituto de investigação na Califórnia, EUA, que estuda o oceano profundo com submarinos telecomandados. Analisaram imagens capturadas ao longo de 20 anos durante os mergulhos para descobrir quais objetos poluem o fundo do oceano. Encontraram um número infinito de objetos de todos os tipos até 4000 m de profundidade. Podemos ver alguns deles no vídeo associado ao artigo. Sacos de plástico e latas de alumínio são os mais comuns encontrados nas profundezas. Mas também observaram cadeiras de plástico, tambores, um container de pneus que perderam no mar, potes de iogurte, etc.
Ao largo da costa, redes fantasmas e cordas da indústria pesqueira
Na camada de lixo acumulado no Pacífico norte, o plástico responde por quase todo o material flutuante (99,9%), de acordo com um estudo publicado pela Nature em 2018. Considerando a sua massa, cerca de metade destes destroços são redes fantasmas, cordas e outros resíduos da indústria pesqueira. Estes últimos representariam mesmo 85% dos mega-plásticos (resíduos de mais de 50 cm) de acordo com uma estimativa destes pesquisadores.
Decifrando as inscrições em alguns objetos onde isto ainda era possível, os cientistas descobriram que 9 línguas diferentes adornavam os escombros, e que eles vinham de 12 países (“made in”). O mais antigo objeto recolhido datado de 1977 confirmando a permanência do nosso lixo no oceano. Estes pesquisadores insistem na urgência de estudar esta poluição, pois não existem estudos recentes sobre a preponderância do equipamento de pesca perdido no mar.
Documentar detritos flutuantes é tão simples como caminhar numa praia, sem necessidade de robôs subaquáticos e câmaras fotográficas. De fato, os detritos flutuantes ou encontrados nas praias e zonas costeiras são bons indicadores dos detritos que poluem o oceano porque as marés os depositam ali. No estado do Rio, é comum encontrar zonas costeiras cobertas de escombros. Estes destroços causam inclusive problemas ao bloquear as hélices dos barcos na Baía de Guanabara. Qualquer pessoa que tenha viajado de barca entre o Rio de Janeiro e Niterói já deve ter visto objetos solitários ou manchas de lixo flutuantes. Antes dos Jogos Olímpicos de 2016, ate um sofá foi observado à deriva nas suas águas.
Na Baía de Guanabara os pneus são os detritos mais importantes (em quilogramas).
Trabalhei com a associação, One Earth – One Ocean “OEOO” em projetos de coleta de resíduos plásticos no oceano. Durante o projeto Jequia, que financiou pescadores para recolher detritos flutuantes na Baía de Guanabara e suas margens, a maior parte do plástico recolhido por peso veio de pneus de automóveis e caminhões, o que se verificou nos projetos seguintes.
Nas praias, pontas de cigarro, pedaços de poliestireno, cotonetes e tampinhas de plástico são os objetos mais comuns.
Em 2019 organizámos limpezas de praias e os resíduos mais recolhidos foram as pontas de cigarro. Na praia de Copacabana, contamos 568 pontas de cigarro em 40 metros de praia, o que corresponde a 56.800 pontas de cigarro em toda a praia de Copacabana – Leme, que tem cerca de 4 km de comprimento. E isto foi depois da passagem das equipes da Comlurb.
No ano passado, na praia do Flamengo, quando ninguém a frequentava, contei o lixo que chegava com as marés. Os objetos mais presentes foram pequenos pedaços de embalagem de poliestireno (isopor), cotonetes, tampas de plástico. Mas também encontrei garrafas de xampu, pentes, chinelos, frascos de medicamentos, latas de tinta, brinquedos, embalagens diversas, chupetas, canetas, embalagens de suco… Muitas marcas estavam representadas (Coca-Cola, Nestlé, Kinder, Natura, Guaracamp, Crac, Minalba, Havaianas,…)
Por outro lado, nenhuma ponta de cigarro, sinal de que são mais propensos a chegar junto com os frequentadores da praia.
Por que o plástico encontrado no oceano é um problema?
O plástico representa riscos para os animais de três maneiras :
1- Existem riscos de emaranhamento em plásticos flutuantes que podem ferir ou sufocar os animais. É a imagem da tartaruga com o canudo no nariz. Muitas redes de pesca perdidas ou descartadas, conhecidas como redes fantasmas, continuam a apanhar animais que morrem desnecessariamente. Embora não representem a maioria dos detritos plásticos nos oceanos, estas redes e outras aparelhagens de pesca têm provavelmente o maior e mais visível impacto na vida marinha. Podem continuar a matar durante anos, mesmo sufocando um recife de coral. Estima-se que mais de 70% dos animais marinhos encurralados se encontram nestas redes fantasma.
2- Os animais confundem os pedaços de plástico com a sua comida, engolindo-os. Estes plásticos acabam por bloquear o seu estômago o que leva estes animais a morrer de fome.
3- Alguns plásticos são fontes de poluição química, tais como pontas de cigarro. Certos poluentes “colam-se” aos plásticos e podem pôr em perigo a vida de certas espécies. Por exemplo, as orcas são particularmente afetadas pela poluição por PCB, que tende a acumular-se nos plásticos. “Bifenilos policlorados”. As populações de orcas na costa ocidental da América do Norte estão em declínio, já não têm crias e os cientistas acreditam que a poluição combinada de plástico e PCB seja a causa.
Esta poluição é também problemática para os seres humanos. Os destroços prejudicam os pescadores ao bloquearem as suas redes: pescadores na Baía de Guanabara relatam que por vezes capturam mais plástico do que peixe. Pode bloquear hélices de barcos e tem um custo económico significativo na manutenção e reparação. Ao matar animais marinhos, têm impacto sobre os estoques pesqueiros já sob forte pressão da sobrepesca. Existem muito poucos estudos, mas ao consumirmos peixe e marisco, estamos também a consumir plásticos e outros poluentes associados que se acumulam na cadeia alimentar. Em 2019, a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) publicou um relatório sobre os efeitos do plástico na pesca e aquacultura que conclui que existe uma falta de dados sobre o assunto. Os plásticos nos oceanos têm portanto consequências económicas negativas diretas (pesca e navegação), nos recursos alimentares que são vitais para muitas comunidades costeiras e muito provavelmente para a nossa saúde quando os consumimos.
Algumas fontes para maiores informações
Fonte 1 (em inglês):
Sobre os riscos de enredamentos em plásticos flutuantes que podem afetar os animais
Fonte 2 (em inglês):
Sobre substâncias que podem pôr em perigo certas espécies
Fonte 3 (em francês) :
Relatório da Assembléia Nacional francesa sobre a poluição por plásticos
Fonte 4 (em português):
Sobre a situação no Brasil em relação ao plástico
Artigo escrito por Caroline Verna, oceanóloga e traduzido por Fédérique Sassaki.
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